segunda-feira, 18 de maio de 2015

Da pesquisa sobre preconceito na UFRGS

Por André von Kugland*

Recentemente saiu uma matéria da Zero Hora dizendo que “87% dos alunos da UFRGS têm algum preconceito de gênero ou contra diversidade sexual,” baseada numa pesquisa feita pelo Instituto de Psicologia da UFRGS.

Além disso, a matéria (repetindo o artigo) dizia que, quanto mais religioso o aluno, mais “homofóbico” e “transfóbico”, tentando associar a religião ao ódio irracional. Ocorre, porém, que muitas das perguntas feitas nada têm com preconceito ou ódio, sendo, ao contrário, simples opiniões racionalmente fundadas, enquanto outras dão conta de reações emocionais perante gays, lésbicas e travestis.

O artigo em que foi baseada a matéria não especifica quais perguntas foram feitas, mas por sorte eu mesmo havia recebido este questionário há alguns anos, e estava no inbox do meu Gmail. Analiso, a seguir, algumas das perguntas:

Perguntas no. 1, no. 3, no. 19, no. 20 e 22: “Sexo entre dois homens/duas mulheres é totalmente errado,” ou “A homossexualidade masculina é uma perversão,” ou “Operações de mudança de sexo são moralmente erradas,” ou “Homens e mulheres deveriam ser proibidos de mudar de sexo.”
Não são preconceitos, mas julgamentos morais, que podem ser fundamentados em premissas racionais. Tampouco implicam que quem assim julga odeie gays, lésbicas ou transexuais.

Perguntas no. 2, no. 5, no. 14, no. 16, no. 18: “Eu acho que homens gays/lésbicas/travestis são nojentos(as)”, ou “Os homens afeminados/mulheres masculinas não me deixam à vontade.”
Obviamente não é um preconceito, mas uma reação emocional de rejeição, não muito diferente daquela do gay que “tem nojo de perereca”, ou da lésbica que tem “nojo de pinto”. E não é necessariamente “homofobia” ou “transfobia” porque não implica que a pessoa odeie gays, lésbicas ou travestis.

Pergunta no. 4: “Eu preferiria que meus filhos fossem heterossexuais.”
Também não implica preconceito ou ódio: há muitos motivos para preferi-lo além do ódio e do preconceito.

Pergunta no. 6: “Eu não me sentiria a vontade em consultar com um médico homossexual.”
Não implica preconceito ou ódio: um homem pode não querer ficar nu na frente de um médico gay pelo mesmo motivo que não o quereria ficar na frente de uma médica mulher, porque se sentiria desconfortável imaginando que talvez o médico(a) sentisse algum desejo por ele. É exatamente a mesma situação da mulher que não vai a ginecologista homem, que é muitíssimo comum.

Pergunta no. 10: “Crianças deveriam brincar com brinquedos apropriados para seu próprio sexo.”
Preferir preservar papéis de gênero tradicionais não é o mesmo que ter preconceitos ou odiar homossexuais ou transexuais.

Pergunta no. 12: “Eu não confio em lésbicas.”
Essa pergunta é uma das poucas que poderiam indicar um preconceito, contanto que fosse reformulada como “lésbicas não são confiáveis.” Aí, sim, haveria, indiscutivelmente, preconceito.

Pergunta no. 16: “Eu iria a um bar freqüentado por travestis.”
Não ir a bares freqüentados por travestis não implica que se odeiem os travestis, caralho. Os bares podem ser ruins, mal localizados, perigosos.

Pergunta no. 17: “Eu apóio os homens gays, mas não gostaria de ser confundido com eles.”
Para não ser preconceituoso é necessário querer ser confundido com gays? Que chances tem um homem com o sexo oposto, se ganhar fama de homossexual? Por que um homem heterossexual iria querer isto?

Pergunta no. 21: “Eu não consigo entender por que uma mulher se comportaria feito um homem.”
Não entender uma coisa não é um preconceito, e nem é ódio. Eu não entendo como alguém pode se sentir sexualmente excitado vendo pés, ou como alguém pode gostar de bife de fígado, ou como alguém pode querer se arriscar a escalar o Everest. Implica que odeie podólatras, apreciadores de bife de fígado ou alpinistas? Não. Implica que tenha algum preconceito em relação a estas pessoas? Não.

Enfim, vendo as perguntas do questionário, chega-se à conclusão de que não, ele não consegue diagnosticar homofobia — o ódio irracional a pessoas homossexuais —, nem tampouco o preconceito. E é, na verdade, uma peça de propaganda contra as religiões tradicionais.


Artigo do estudo: http://link.springer.com/article/10.1007/s13178-015-0191-z (Quem é aluno pode acessar o texto através do proxy.)



*ANDRÉ VON KUGLAND é acadêmico do curso de Letras da UFRGS.

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