quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Comunistas de boutique

Por Régis Antônio Coimbra*

Considero injusto criticar candidatos que supõe ser comunistas por não entenderem Marx. Marx é para especialistas. Mas há comentadores que podem ajudar a entender a teoria dele. Resumindo, calcado nos economistas clássicos, notadamente David Ricardo, Marx considerou que a tendência do proletariado à rendas de quase estrita subsistência decorria não só do fato de que os incrementos de renda que o capitalismo trazia aos proletários tendia a ser consumida por um número maior de filhos que sobreviviam (e, sobrevivendo, consumiam em comida e outros itens de quase estrita sobrevivência, os acréscimos de renda que obtinham no capitalismo mais do que em qualquer outro momento histórico), mas também da exploração pelos capitalistas, que se apropriavam da mais valia.

Nisso, o principal e mais fundamental erro de Marx: ele não reconhecia o tanto que o capitalista, seja ao administrar um negócio, seja ao administrar riscos no investimento do puro capital financeiro (momento Luciana Genro...), agregavam valor à produção, nem que fosse ajudando quem produz a encontrar quem precisa (e pode...) consumir - o papel do comerciante.

O segundo grave erro de Marx foi supor que o capitalismo seria para sempre do modo como ele o "fotografou", com o que ele identificou como um desequilíbrio entre o crescimento populacional proporcional e absoluto do proletariado, e pelo menos proporcional dos burgueses (os capitalistas) e pequeno-burgueses (os lacaios dos burgueses... o mais próximo de classe média que Marx teorizou mais em detalhe). Isso envolvia também um problema de desequilíbrio entre a capacidade de produção, crescente, e a capacidade de consumo, que Marx identificava como restrita à burguesia e pequena burguesia, numericamente insignificante e cada vez menos significante (menos, ao menos proporcionalmente, numerosa em relação ao proletariado), o que levaria a crises cada vez maiores e mais graves de superprodução e subconsumo.

O primeiro erro (sobre a expropriação da mais valia) é teórico e é parcial. De fato, o burguês tem vantagens de negociação com a mão de obra não especializada e, nisso, leva vantagens. Mas é um erro insanável quanto ao não reconhecimento do trabalho do empresário ou capitalista (do especulador financeiro, como diria Luciana genro).

O segundo erro é histórico. Marx chegou a acompanhar detidamente o movimento cartista pelo qual, na Inglaterra, foram institucionalizados direitos como que trabalhistas e de crianças. Ainda durante seu tempo de vida (em sua última década), na Alemanha, no sistema de civil law ou do dito sistema romano-germânico de direito (mais parecido com o nosso), foram criadas as primeiras leis "trabalhistas" (primeiro dos acidentes de trabalho, em seguida direitos mais propriamente trabalhistas). Isso é, viu surgir já a social-democracia e a construção algo acelerada de uma classe média com considerável poder de consumo - adaptação do capitalismo ao problema estrutural do descompasso da capacidade de produção sem mercados consumidores proporcionais.

Que Marx tenha cometido esses erros em nada diminui seu gênio, limitado pelo conhecimento de seu tempo e apenas parcialmente por seu... mau gênio. Sua crítica ainda é válida ao denunciar a dura diferença entre as posições do trabalhador assalariado ou mesmo pequeno empresário cuja renda se limita à mais ou menos estrita subsistência (sem possibilidade de poupar de modo significativo) e o capitalista, empresário ou mesmo assalariado com rendas muito superiores às suas necessidades ou mesmo possibilidade de consumo.

Marx, no entanto, não pretendia apenas analisar (mal, não por culpa apenas própria) e entender (mal, não por culpa apenas própria) a sociedade. Com base em suas análises e entendimento frágeis, Marx se dedicou a prever o futuro e a orientar formas de otimizar as mudanças. Nisso, passamos dos erros para os sonhos e pesadelos.

Marx entende que a história da humanidade é a história da luta de classes. Toda a história da humanidade seria basicamente a história de umas classes explorando outras. Não havendo propriamente meios de produção, os mais fortes (e, na família, os homens), subjugando e explorando os mais fracos (na família, as mulheres). Havendo meios de produção, os proprietários desses meios (notadamente a posse de terra) podiam ter para si excedentes de bens de consumo, como comida, muito além do que poderiam consumir e, assim, podiam, por exemplo, sustentar especialistas, que não se precisariam dedicar à produção de mais alimentos, mas a fazer adornos, servir de seguranças (capangas, exércitos...), glorificadores da classe dominante etc.

Em diversos momentos um modo de produção foi superado por outro, o poder político de uns, calcado em certo tipo de produção, sendo superado economicamente por outro. O exemplo mais próximo de Marx foram as revoluções burguesas, nas quais a aristocracia, cuja base de poder era a posse de terras, foi superada pela burguesia, cuja base era o comércio e indústria.

Com base nesse exemplo mais marcante e generalizações retrospectivas desse fenômeno para outros momentos históricos, Marx conclui que o capitalismo seria o momento mais radical da luta de classes, com mais radical exploração, isso envolvendo uma maior concentração de poder econômico e político num proporcionalmente menor grupo de pessoas, os burgueses, que paradoxalmente, no entender de Marx, dependeriam mais radicalmente do proletariado do que outras classes dominantes. Bastaria o proletariado perceber que os burgueses dependiam deles mais do que eles dos burgueses para que se iniciasse mais ou menos abruptamente (como se pode diferenciar que ocorreu nas revoluções burguesas, contrastantemente nas reformas e revoluções parciais britânicas, de um lado, e na catastrófica e radical revolução - ou sucessão de revoluções - francesa), a revolução do proletariado.

Essa revolução seria difícil, como difícil (e fracassada) foi a comuna de Paris, que Marx teve a oportunidade de aproximadamente acompanhar e que falhou por ter sido um levante relativamente isolado, que teve de se contrapor a toda uma constelação de países capitalistas e mesmo à tendência do revolucionários de regredir a formas mais primitivas de exploração de classe. O grande problema dessa revolução é extinguir a tendência à luta (e exploração) de classes. Para tanto precisa se universalizar (ser estendida e vencida em todos os países relevantes) e, uma vez feito isso, como que atravessar o deserto por uns 40 anos, como segundo a bíblia teria feito Moisés, extinguindo a geração contaminada pela cultura da luta (e exploração) de classe.

Mesmo tendo considerável clareza da dificuldade desse sonho, Marx não se furtou a incentivar o pesadelo de uma tal transição. Pode ajudar a entender o fenômeno a distinção da transição como o período de ditadura do proletariado, no socialismo, e a conclusão do processo na abolição do estado (Marx, enfim, mostra-se um anarquista) no comunismo. O objetivo é o comunismo, mas o meio é o socialismo.

O socialismo assumidamente não é um momento de liberdade, mas de ditadura e guerra. Guerra dos países que iniciam tal revolução contra todos os demais países, ainda capitalistas ou em outros estágios mais primitivos de luta de classes; ditadura (ou guerra civil) dos revolucionários contra os contra-revolucionários dentro do próprio país.

Isso "justifica" o horror que foram ou são todos os casos de socialismo real. Em cada caso, a ditadura do proletariado envolve fiscalizar rigorosamente os cidadãos para identificar os contra-revolucionários e espiões dos países capitalistas e isso significa que haverá muitos policiais, fiscais, delatores e algumas vítimas de mal entendidos que, até esclarecerem que não são espiões ou contra-revolucionários... bem, não raro já terão morrido.

Tanto pior, tal estrutura inevitavelmente paranoica leva a um encastelamento não de uma horizontal democracia participativa na qual o proletariado toma o controle de fato do estado, mas numa estratificação em que poucos membros do partido comunista de cada um dos países do socialismo real encastelam-se com poderes especiais e excepcionais e, tragicamente, tendem a se corromper (e rápido) com tal poder. A burocracia acaba tornando-se uma burguesia, com a desvantagem de que muito mais autoritária e paranoica. E, tanto pior, enquanto a revolução do proletariado não se dissemina entre todos os países relevantes, essa paranoia até que se justifica.

Assim, quem defende o socialismo, deve estar disposto a gerações de sofrimento exacerbado sem muita perspectiva de dar certo. Nesse sentido, é admirável (e outro tanto assustador), que haja gente séria (não é o caso da maioria dos que chama atenção para si próprios como supostamente socialistas ou comunistas) que acredita que isso é possível e que vale a pena.

Uma alternativa para o comunismo, no entanto, é a ampliação das classes médias. O proletariado nunca teve a menor chance de liderar uma revolução. Estavam brutalizados por trabalhos fragmentados em processos complexos dos quais não tinham uma percepção razoavelmente ampla. Iniciadas as revoluções, invariavelmente eram obliterados por pequeno-burgueses educados e espertos. O exemplo mais eloquente disso foi Lênin que eu acredito que sinceramente sonhava com um socialismo que num tempo razoável (algumas poucas gerações) chegasse no comunismo. Mas isso rapidamente se desfez com um atentado no qual ele quase morreu e a partir daí encastelou-se. Seu sucessor, Stálin, não poupou esforços (nem vidas humanas) para evitar ser vítima de qualquer atentado.

Esse é um roteiro ao qual o sonho do socialismo tende fortemente, embora a Rússia pouco tivesse a ver com o que Marx entendia como o lugar ideal para se iniciar a revolução do proletariado - o ideal seria na Inglaterra; secundariamente, poderia começar na Alemanha ou França. Iniciar a revolução em países que sequer eram capitalistas, como Rússia ou Cuba é condenar tais revoluções a lutar contra gigantes capitalistas uma guerra mais ou menos fria sem esperança.

A esperança do levante popular esbarra no fato de que mesmo os mais pobres, hoje, tem considerável poder de consumo que é inevitavelmente prejudicado por economias "de guerra" como as que tipicamente se instalam em países socialistas, preocupados com a fiscalização de seus cidadãos e possíveis espiões estrangeiros. Se houve alguma chance disso ocorrer com os supostamente heroicos (mas embotados) trabalhadores braçais e cheios de filhos da indústria pesada do capitalismo que Marx viu no século XIX, no capitalismo de serviços e classes médias com considerável poder de consumo dos séculos XX e XXI, é ridiculamente inviável. Para começar, mesmo os mais rústicos militantes de esquerda são, na verdade, almofadinhas; revolucionários de boutique - com curiosa predileção por produtos da Apple.


*RÉGIS ANTÔNIO COIMBRA é 1º Vice-Presidente do Movimento Estudantil Liberdade. Filósofo e advogado formado pela UFRGS. Especialista em Direito e Economia e, atualmente, é Acadêmico da Licenciatura em Dança pela UFRGS e Professor no Colégio Tiradentes da Brigada Militar.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Carta aberta a Luciana Genro: Eu aceito o desafio e estudei o socialismo


“Você não consegue comida chinesa delivery na China e charutos cubanos são racionados em Cuba. Isso é tudo o que você precisa saber sobre comunismo.”- P. J. O’Rourke

Luciana Genro, candidata do icônico PSOL à presidência, com menos de 1% das intenções de voto, foi entrevistada no programa The Noite, apresentado por Danilo Gentili.

Genro foi perguntada por Gentili e por Roger e Bacalhau, da banda Ultraje a Rigor, sobre a questão do socialismo defendido por Luciana. Roger afirmou que as experiências socialistas “já mataram mais de 80 milhões de pessoas no mundo”, e Luciana obtemperou: “Não! Não seguiam. Coitado do Marx! Ele se revirara na tumba cada vez que falavam o nome dele”. Danilo rebateu: “Que homem horrível para se comunicar então, não acertou uma…”

O caldo engrossou mesmo e ganhou destaque absoluto por mais de 24 horas nas redes sociais quando Luciana quis afirmar que Danilo Gentili, que morava numa periferia pobre em Santo André, não aceita o totalitarismo socialista por ser rico, e que é o capitalismo que gera misérias como o Holodomor: “Só acha que sim porque tu tá em uma situação privilegiada. Se tu tivesse na ocupação que visitei hoje, morando em um barraco, tu ia achar que ele fracassou também”, completou. Danilo afirmou: “Eu ia é estar sendo fuzilado se fosse comunista!”.

A “resposta” da candidata presidencial, que não parece conviver muito bem com a idéia de que alguém sob sua jurisdição não aceite a religião socialista, foi tergiversante e agressiva: “Isso não é comunismo, Danilo. Se tu estudasse um pouco mais ia conhecer o assunto”, fuzilou (um site que comentou a quizomba e afirmou o tempo todo que “Luciana teve que se impor para desmentir as informações equivocadas” cometeu o ato falho de descrever que neste momento Genro “disparou”).

Luciana Genro, a candidata famosa por a) ninguém se preocupar em lhe perguntar alguma coisa em debates eleitorais enquanto não for obrigado a tal; e b) falar “capital financeiro” como substantivo, adjetivo, verbo, vocativo, aposto, conjunção e locução adverbial a cada 20 segundos, pratica o vomitório de clichês de que o socialismo real, paradoxalmente, é irreal e não existe.

O socialismo real seria lindo, tudo seria perfeito, seria uma espécie de Paraíso muçulmano sem precisar expor a rabadilha na direção oposta a Meca 3 vezes por dia. O problema é que o socialismo real é o socialismo que é, ehrr, real: o que existiu seguindo os preceitos de Karl Marx na União Soviética e depois na China ou no Zimbábue, em Cuba ou no Afeganistão, gerando sempre a mesma miséria.

Mas segundo Luciana Genro, “se estudássemos um pouco mais, íamos (sic) conhecer o assunto”. Pois bem, cara Luciana Genro, engraçado você falar isso. Porque não tem assunto que tenha estudado mais nos últimos tempos e nessas greves intermináveis na USP promovidas pelo seu partido do que o socialismo. Talvez seja a hora de a senhora estudar um pouco mais o assunto com quem gostaria de estudar tragédia grega, mas é forçado a estudar comunismo para conseguir enfrentar grevistas comunistas do seu partido trancando portas autoritariamente.

Estudando socialismo-comunismo: um guia para Luciana Genro

“Eu cresci sob o comunismo então nós apenas podíamos aprender russo, e então quando o comunismo caiu em 1989 nós pudemos aprender um pouco mais de coisas e tivemos autonomia para viajar e liberdade de expressão – e a liberdade para sonhar, de verdade.”- Petra Nemcova

É algo perigoso, cara Luciana Genro: não canso de afirmar, sem nunca ser rebatido com um único exemplo, que só existem pessoas que eram socialistas, ou mesmo apenas de esquerda por que nunca leram gente crítica dessas ideias – e exatamente por isso, crê que não se é socialista/esquerdista apenas por, como a senhora crê religiosamente ao falar de Danilo Gentili, que são ricos com medo de perder “privilégios” – esquecendo-se de que Danilo Gentili e tantos outros eram pobres de marré de si e ascenderam na vida, ao contrário da senhora, que foi bem nascida e continua rica.

Pelo contrário: estudiosos do socialismo e da esquerda abundam, e são todos críticos. Pior: a maior parte deles eram como a senhora: de esquerda, mas tentaram aprender mais sobre essa esquerda. CATAPIMBA! No decorrer dos estudos, viraram todos críticos mordazes do comunismo e da esquerda.

Eric Voegelin, talvez o maior filósofo do séc. XX, passou fome para estudar, tinha as unhas amareladas e mal feitas, fumava charutos mata-rato. Mas foi duvidando de que o motor da história é a “luta de classes” (nunca existiu em lugar nenhum do mundo, e mesmo na Revolução Francesa, onde parece ter “eclodido”, foi forçada e obra da burguesia, como revela François Guizot, o maior estudioso da Revolução) que Eric Voegelin começou a engastar no cânone sua estupenda filosofia, onde teve de estudar dos hieróglifos egípcios até as novidades da psicologia e da linguística para formar um todo coerente.

E que tal Eric Hoffer, talvez o maior crítico dos movimentos de massa do mundo que seu partido tanto fomenta (na verdade, a senhora bem sabe que o PSOL não tem outra função além de fazer mobilizações de rua, já que o que mais conseguem em eleições é tomar nosso dinheiro para o fundo partidário, né?), junto a Ortega y Gasset? Estivador, dormia em estações de trem e teve como trabalho mais limpo ser garçom num porto. Auto-didata, estudava de noite obras que iam dos grandes clássicos da teoria política desde a Antigüidade pré-clássica até relatos sobre a China da revolução maoísta recém-inaugurada. Como Voegelin, e como todos os críticos do socialismo, odiava o socialismo e sua vertente nacional-socialista.

Talvez você não saiba porque tu precise estudar um pouco sobre o assunto, Luciana Genro, mas foi Adolf Hitler que disse que “se nós somos socialistas, nós precisamos ser anti-semitas. Como, sendo um socialista, você pode não ser anti-semita?”, como está na capa do livro The Lost Literature of Socialism, de George Watson, que aparentemente a senhora não estudou.

Danilo Gentili também era um pé-rapado, Luciana Genro, e não caía nessa conversa. Estudou por conta e hoje é um ferrenho anti-comunista. Eu também, Luciana Genro, morava em quebradas como Itaquera, Itaim Paulista e na minha infância só visitava lugares como Osasco, Diadema, Ermelino Matarazzo, Jardim Danfer ou Calmon Viana, onde a senhora só pisa com a comitiva do seu partido ou acaba sendo assaltada. Como meu ídolo Thomas Sowell, ortodoxamente conservador e tão adensado na cultura negra que até seus poucos anos nem sabia que amarelo podia ser uma cor de cabelo – e de passado marxista.

O problema maior, Luciana Genro, é que nunca vi o contrário: alguém que era anti-comunista ou anti-esquerda e, de repente, se tornou esquerdista lendo mais sobre o assunto. Prova é que vocês, comunistas/esquerdistas, nunca ouviram falar nem nos maiores e mais básicos clássicos do pensamento anti-esquerda, seja liberal ou conservador.

O caminho inverso nunca foi trilhado: nunca houve quem estudasse críticos da esquerda e do socialismo e concluísse: “poxa, o melhor é ser de esquerda!”. Vide a patética tentativa de um “Dicionário Crítico do Pensamento de Direita”. A saída para continuar sendo de esquerda é tascar menosprezo por intelectuais peso-pesadíssimo que vão de Peter Schiff a David Stove, de Russell Kirk a Roger Scruton, e não os ler nem tentar contra-argumentar seus escritos.

De Bernard Lonergan a David Horowitz (um dos criadores da new left, e hoje o maior orador conservador e denunciador dos crimes da esquerda na América, que conta como teve de brigar com a família inteira por largar a esquerda na sua auto-biografia O Filho Radical), de Edmund Burke a René Girard, de Mário Ferreira dos Santos a Mark Levin, a norma inapelavelmente inescapável é que qualquer pensador não-esquerdista é proibido para os esquerdistas, pois quem começa a lê-los tem medo de virar direitista.

Isto não é revelador tanto do motivo de seu medo – temos melhores argumentos – quanto do método da esquerda, que é sempre a força, a proibição, a coação (quando não pode usar os dois primeiros) e a busca de uma hegemonia de pensamento único? Como diz Ann Coulter, “se esquerdistas gostam, é subsidiado; se não gostam, é proibido”.

Não são vocês os “socialistas científicos” contra os “utópicos”?

“Mesmo agora nós sentimentos que Stalin foi devotado ao comunismo, ele era um marxista, e isto não pode e não deve ser negado.”- Nikita Khrushchev

É um clichê muito típico afirmar que o “socialismo real” não é o socialismo que vocês, socialistas, pregam. É o mesmo que um nazista afirmando que o nazismo “real” é ruim, portanto ele, sim, que é um verdadeiro nazista. A falácia do “escocês verdadeiro”.

É uma inversão típica: o socialismo real é o que acontece na realidade. O socialismo ideal pode ser lindo – como também o é o capitalismo ideal, ou na cabeça de alguns dementes, o fascismo ideal. Como todas as coisas ideais, têm a característica de não existir. O problema é a experiência real destas coisas: concreta, dura, muitas vezes pontiaguda.

Como levar a sério algo que só consegue ser defendido no terreno puro das idéias platônicas, sem nenhum contato com a realidade, hagiograficamente virginal a qualquer aplicação? Não é melhor então votar em pastores evangélicos, místicos ou cartomantes do que em socialistas? Certamente acertam muito mais.

A senhora diz que Marx foi “deturpado”. Ora, a experiência real garante que, na União Soviética, Marx deturpa você. Mesmo admitindo que fosse assim, quer dizer que Lenin traiu Marx? Que pena, deu azar. Aí veio Stalin! E Stalin também traiu Marx? Caramba, coincidência. Mas com Mao daria certo! De novo deturpou? Poxa vida, estamos mesmo azarados. Vamos tentar na Coréia do Norte com Kim Il-sung! Mais uma vez? Que tal na Romênia com Ceaușescu? Cuba com Che e Fidel? Vietnã com Ho Chi Minh? Alemanha Oriental com Walter Ulbricht? Zimbábue com Robert Mugabe? Iraque com Saddam Hussein? Camboja com Pol-Pot? Afeganistão com Muhammad Taraki? Venezuela com Chávez? Uganda com Idi Amin? Albânia com Enver Hoxha, o cara que proibiu até a barba? Etiópia com Mengistu Haile Mariam? Bengala Ocidental com Jyoti Basu? Sérvia e Iugoslávia com Slobodan Milošević, o cara que fez a “limpeza étnica” mais brutal da Europa pós-Hitler, para vocês que juram que nacional-socialismo nada tem a ver com socialismo? TODOS ELES deturparam Marx, só vocês do PSOL sabem o que é marxismo de verdade?!

A senhora andaria num modelo de avião que caiu nas 100 vezes em que tentou levantar vôo, se alguém garantisse que agora vai, candidata? E nem comento da sua “dialética” em afirmar tal paneleirice e a um só tempo posar de punho levantado a la mensaleira em Cuba, diante de um retrato de Che Guevara.

Para começar, se acredita tanto que os países que fuzilam não são comunistas, talvez você tenha pulado as origens do socialismo. Afora experiências como as Robert Owen, Saint-Simon, Enfantin, Fourier etc, tão bem descritas por Edmund Wilson em Rumo à Estação Finlândia, a melhor história do pensamento socialista até a Revolução (e o autor, veja a senhora!, era trotskysta quando escreveu o livro, e poucos anos depois era o maior crítico literário conservador do mundo de então!), urge pular estes “utópicos” (como se Marx não o fosse, afinal, a senhora acredita que tudo o que ele escreveu não foi aplicado! ainda é utopia!) e voltar ao que Engels e Marx eles próprios diziam:

1) Dentre todas as nações e naçõezinhas da Áustria, apenas três foram portadoras do progresso, intervieram ativamente na História e ainda são capazes de se manter vivas – os alemães, os poloneses e os húngaros. Esses povos são, portanto, revolucionários.

Quanto aos demais grandes ou pequenos povos ou nações [da Áustria], estes têm agora a missão de perecer na tempestade revolucionária mundial. São agora, por isso, contrarrevolucionários. (Friedrich Engels, Der magyarische Kampf, in “Neue Rheinische Zeitung”, nº 194, de 13 de janeiro de 1849, p. 168)

http://www.mlwerke.de/me/me06/me06_165.htm
………
Original: Unter allen den Nationen und Natiönchen Östreichs sind nur drei, die die Träger des Fortschritts waren, die aktiv in die Geschichte eingegriffen haben, die noch jetzt lebensfähig sind – die Deutschen, die Polen, die Magyaren. Daher sind sie jetzt revolutionär.
Alle andern großen und kleinen Stämme und Völker haben zunächst die Mission, im revolutionären Weltsturm unterzugehen. Daher sind sie jetzt kontrerevolutionär.
_________________

2) Portanto, luta, “luta impiedosa de vida ou morte” contra o eslavismo traidor da revolução; luta de aniquilação e terrorismo implacável – não no interesse da Alemanha, mas no interesse da revolução!(Friedrich Engels, Der demokratische Panslawismus, in “Neue Rheinische Zeitung”, nº 222 de 15 de fevereiro de 1849, p. 286)

http://www.mlwerke.de/me/me06/me06_270.htm
……
Original: Dann Kampf, “unerbittlichen Kampf auf Leben und Tod” mit dem revolutionsverräterischen Slawentum; Vernichtungskampf und rücksichtslosen Terrorismus – nicht im Interesse Deutschlands, sondern im Interesse der Revolution!

Isto sem falar num manancial inesgotável de impropérios que Karl Marx usava para se referir a “ser humano” (cachorro, Hund, em suas cartas com Engels, era o mais higiênico) e contra todos os povos que achava que deveriam perecer na Revolução. Há muitas citações falsas, como a do “Holocausto revolucionário”, mas a coisa não melhora muito quando vemos como Marx defendia até mesmo o imperialismo prussiano contra franceses.

Boa parte das diatribes do homem que queria trazer o reinado de Lúcifer na Terra (são palavras dele) também é compilada em Requiem for Marx, organizada por Yuri Maltsev (veja só, Luciana! um cara que trabalhou como economista da Academia Soviética de Ciências, e que por isso contou todos os podres da “medicina socialista de primeiro mundo” antes de o Mais Médicos expô-los a quem não acreditava! e hoje editor de livros contra a pobreza, através do capitalismo!).

Aparentemente a senhora precisa estudar o que Danilo Gentili e nós, liberais-conservadores, estudamos anos antes da senhora. A senhora chega com a farinha, nós já temos todo o bolo.

Então, como não concluir que nações que praticaram democídio, o assassinato da população civil pelo governo, na feliz expressão do professor Rudolph Rummel (indicado ao Nobel da Paz e lembrado por seu falecimento recente no Memorial das Vítimas do Comunismo), como sendo comunistas e marxistas?

Quando Lenin confisca a produção de grãos e a redistribui a partir de um aparato burocrático central, não está sendo comunista? Quando pratica o Holodomor, o genocídio de mais de 4 milhões de ucranianos de fome para puni-los por serem “contra-revolucionários” (ou seja, não darem todos os grãos que produziram aos burocratas que não o produzem, e querem tomá-los à força, na primeira reforma agrária do século XX), não está agindo como Marx prescreveu? E não é o modelo educacional centralizado que você prega que faz com que Holodomor nunca caia no vestibular, e seja completamente desconhecido do Brasil? Que tal “estudar um pouco o assunto”, candidata?

Como o velho Marx, que não reconheceu a filha que teve com a empregada (!) e levou duas filhas ao suicídio, e o velho Engels, que dava festas para seu próprio bigode (sic), virariam no túmulo com isso? Foi escrito por eles!

Não apenas o socialismo existiu – o comunismo também existiu e existe.

“Comunismo é um terço prática e dois terços explicação.”- Will Rogers

Voltemos a Karl Marx, que a senhora garante que foi “deturpado”. Lá pelo final do capítulo 3 d’O Capital, Marx explica como será a transição da fase socialista – o totalitarismo estatal pior do que o nazismo – para o comunismo, a sociedade “sem Estado”. Ora, em apenas um parágrafo e meio de tergiversação, o menino-que-queria-ser-Lúcifer explica que, na verdade, a idéia de uma fase social “sem Estado” significa que o socialismo está tão consolidado que já é indistinto da sociedade, não precisando mais ser imposto à força.

Com isso, todos os órgãos da Revolução, seus tribunais revolucionários, sua burocracia infinita, sua redistribuição centralizada tornam-se órgãos da sociedade. Assim, Estado e sociedade estão tão fundidos que já não se fala mais em transição, e sim num pleno comunismo consolidado.

Portanto, Luciana Genro, não tenho nenhuma fonte além de Karl Marx ELE PRÓPRIO para garantir que Stalin escravizando milhões no Gulag e em construções “populares”, onde morriam centenas de milhares como a construção do Canal Mar Branco-Báltico, era já comunista, e não socialista. Ninguém mais sequer cogitava a idéia de um retorno ao capitalismo.

Quando Mao Zedong, após seu Grande Salto para a Frente, sua Revolução Cultural e outros métodos de confisco de grãos que deixaram os camponeses comendo 100 g de grãos por dia, tornando cascas de árvore uma das maiores iguarias da China comunista, já estamos não no socialismo, mas no comunismo pleno – tão consolidado que até hoje a China não abandonou o Estado totalitário.

Quando Pol-Pot assassina 24% da população do Camboja em questão de 3 anos, mandando para o abate até mesmo quem seja alfabetizado ou use óculos, está não em “transição”, mas com o comunismo consolidado. O que nem o nazismo nunca conseguiu.

Adolf Hitler, perto de socialistas, cara Luciana Genro, vai pro Tribunal das Pequenas Causas. E ao contrário do que a senhora diz, qualquer interpretação de texto básica não vê isso como “apologia ao nazismo” que ofenda suas “raízes judias”, e sim como a maior crítica possível ao internacional e ao nacional-socialismo.

O socialismo que não era socialismo “real”

“Só é possível ter igualdade econômica com uma extrema desigualdade de poder político.”- Joseph Sobran

Mas talvez a senhora se refira a estudos como o essencial livro Socialismo, de Ludwig von Mises, o maior economista da humanidade, recentemente vilipendiado sem ser lido pela esquerda pois o interesse em suas obras disparou quando voltou a ser conhecido no Brasil. Mais uma vez, só há dois tipos de pessoas: as que criticam Mises e as que já o leram. Nunca os dois tipos estão no mesmo ser vivo.

Neste estudo, Mises prova que o socialismo é, afinal, impossível: estatizar toda a atividade econômica (e até pensamentos podem ser economicamente utilizados) só pode gerar um totalitarismo feroz, mas nunca permitirá que riquezas sejam criadas para toda a população, causando necessariamente fome. Algum país socialista conseguiu viver sem fome, candidata Luciana Genro?

Todavia, há um agravante: Mises sabe que economicamente o socialismo de fato nunca existiu: os irmãos Castro, os dois homens mais ricos do mundo, donos de todo o trabalho escravo de uma ilha inteira, proíbem até que alguém que não tome todo o café que consegue com sua carta de racionamento (já existiu isso em algum capitalismo laissez-faire, Luciana?) venda o excedente para não causar desigualdade, mas as pessoas continuam vendendo livremente às escondidas, ou todos morreriam de fome em qualquer socialismo.

Porém, Mises também sabe que isso não impede que o socialismo como sistema político de imposição ditatorial de um totalitarismo seja uma realidade que mais de 150 milhões de vidas sentiram em suas peles.

Socialismo, o poder total do Estado sobre o indivíduo

“Comunismo é o poder soviético, mais a eletrificação do resto do país.”- Vladimir Lenin

Agravamos: seu discípulo, Friedrich Hayek, Nobel de Economia, em um dos livros mais importantes do século XX, O Caminho da Servidão, mostra que o poder necessário para se construir um centralismo burocrático exige muito mais do que o poder para apenas manter a lei de manutenção da paz. Com o tempo, gasta-se mais esforços cuidando do próprio centralismo do que tratando de distribuição de renda, confisco de terras ou o que quer que seja.

Exatamente a situação do Brasil hoje, não? Parece que gastamos mais com propaganda e shows partidários na Petrobras do que lembrando que ela é uma empresa de petróleo. Ela sozinha tem 10 vezes mais assessores de imprensa do que todos os grandes jornais do Brasil somados. É o caminho da servidão com petrodólares.

Mais cirúrgico ainda: sua análise deslinda como a nova esquerda, preocupada em “direitos” dados a grupos específicos, também age em função do totalitarismo: cada nova lei para proteger uma minoria, cada “criminalização” de um comportamento até ontem normal, ou ao menos tolerável e “convivível” é mais uma siracura atolada de burocratas para verificar se a auto-declaração racial de um candidato a cotas está correta – feita no olhômetro, claro. E assim por diante.

Quando os liberais brasileiros descobrirem isso, também ressuscitarão a importância de Hayek à atualidade, pode apostar. Ninguém melhor do que ele para explicar por que o socialismo começa tentando “emancipar” os pobres e termina apenas tentando assassinar e roubar os ricos.

A ditadura do proletariado “democrática”?!

“Mesmo agora nós sentimentos que Stalin foi devotado ao comunismo, ele era um marxista, e isto não pode e não deve ser negado.”- Nikita Khrushchev

Estranho mesmo falar que modelos ditatoriais são “deturpação” de Karl Marx, quando o que Marx prega é uma estrovenga chamada “ditadura do proletariado”, como previsto na sua Crítica ao Programa de Gotha.

Este termo suscita muitos debates entre socialistas, como Karl Kautsky, que escreveu um livro assim intitulado criticando a forma como Lenin usava o termo de Marx para justificar tudo.

Ora, em Marx, vemos que a democracia é uma convenção burguesa, um “teatro” (termo que, curiosamente, é o mesmo usado pelo conservador Tocqueville).

Seu pensamento acredita que existem “classes sociais” (note que a taxonomia coloca “classe” como mais estanque e imutável até mesmo do que “família”, “gênero” ou “espécie”, o que é uma boa jogada propagandística de Marx), que supostamente estão em luta. Só que uma classe é “dominante” eternamente, então sempre ganha.

Assim sendo, eleições apenas refletem o interesse da tal “classe dominante” (vocês deixaram esse termo fora de moda porque já estava meio brega, né?). Para Marx, portanto, toda democracia seria uma “ditadura de classe”, e quando um proletário subisse ao poder, ao invés de jogar o jogo da “convenção burguesa”, deveria fazer Revolução, ou seja, não dividir o poder.

Isto é o que pensam até mesmo os líderes do PCdoB – basta tomar o poder e não largar o osso. Não precisarão mais dividir o poder, pois o interesse de um é o interesse de todos – os “proletários”, os “trabalhadores”, hoje os “progressistas”, já que o capitalismo é tão bom que faz com que ninguém mais dependa da prole e as idéias comunistas só vicejem em solo em que ninguém faça trabalhos pesados.

Como crer, então, que homens plenipotentes do destino de cada homem sob sua jurisdição, de Lenin a Kim Jong-un, de Tito a Choummaly Sayasone, de János Kádár a Muammar Qaddafi, não sejam ditadores brutais exatamente como Marx queria?!

O comunismo – não apenas o socialismo – pasme, existiu!

“A verdadeira questão por trás dessas pessoas que são contra armas, a razão pela qual o fazem é porque elas querem controle. Elas querem controle das pessoas. É isto que é o socialismo e o comunismo.”- Luke Scott

Com tudo isso que estudamos, ao contrário da senhora, talvez seja a hora de lidar com Kuehnelt-Leddihn. Ele sabia que o apelo do comunismo é aristocrático, ao contrário do que a senhora pensa e quis erroneamente dar a entender ao pobretão Danilo Gentili – e que explicaria porque ele cativa tanto a senhora, ricaça que nunca precisou pegar um trem de subúrbio 11:40 da noite na vida.

No século XIX, ser funcionário público era o auge da carreira de alguém (lembre-se que Hegel, como professor de filosofia, tinha um status público comparável a um ministro de Estado). Com o aparato estatal poderoso da ascensão do Estado moderno, mas ainda não tentando administrar coisas que não são da sua alçada como a economia, funcionários públicos eram oficiais militares, burocratas de alto escalão, gestores de gastos e administração ou relações exteriores. Apenas administradores muito bem preparados, portanto.

A promessa do comunismo, a abolição da propriedade privada e a transformação de todos em funcionários públicos, chamava a atenção não de uns pobretões como Danilo Gentili ou eu, Luciana Genro, mas de gente que nada em dinheiro como a senhora. Era uma promessa de fartura como dizer hoje que todos receberão verba partidária, como a que a senhora recebe.

Contudo, como Frédéric Bastiat já havia alertado no começo do século XIX, a conta não fecha: se toda a sociedade vive do Estado, quem vai bancar o Estado? O Estado é a entidade que apenas age por força dentro de um território. É por isso que a idéia de estatizar tudo atrai tanta gente psicopata, e por isso que o socialismo não pode ser senão uma força de coação extrema.

Todavia, retomando o conceito clássico de “democracia” de Platão e dos gregos até Tocqueville, ou seja, a corrupção da “politéia”, as leis muitas vezes não-escritas que regem um povo, Kuehnelt-Leddihn considera que tanto o nazismo como o comunismo, nesse sentido clássico, seriam “democracias”, ou seja, corrupção da politéia: lá não vale uma lei que proteja os indivíduos, e sim a tirania da maioria. Tendo 50% mais 1 dos votos, qualquer coisa pode se tornar legítima, inclusive estes 50% + 1 matarem os 49,9…% restantes. É o nazismo propondo a “solução final” contra os judeus, é o socialismo “expurgando” os “kulaks” (equivalente ao português “coxinha”, que deveria designar ricos, mas passa a designar qualquer um que não aceite o poder total socialista).

São os tribunais revolucionários da “lei como criança” de que fala Aleksandr Solzhenitsyn quando comenta como era “legítimo” e coisa do sistema (e não obra de doença mental de um homem só) matar dezenas de milhões no regime soviético, pois a lei era para “a classe trabalhadora”, expurgando a burguesia – e não é a senhora mesma que quer uma lei para tomar o dinheiro dos ricos à força? Sob qual pena? Depois, o que virá?

Esta “democracia” em sentido clássico é apenas o primeiro passo do totalitarismo (o que é corroborado por Hannah Arendt, Alain Besançon e praticamente qualquer outro estudioso do totalitarismo, cara Luciana Genro; viu como nós estudamos, e a senhora não?). Afinal, não é um poder dividido, ou com alguma lei eterna de contrapeso: é a ditadura do proletariado, é o socialismo como Partido-Estado, é a autonomia dos povos, que decidem sem leis o que querem pela força da maioria. É, em suma, genocídio.

Como se vê, Kuehnelt-Leddihn não reclamaria de vocês considerarem que fazem a “ditadura do proletariado democrática” – apenas sabe que ter até nosso direito à vida não assegurado por leis imutáveis da politéia, mas sendo discutido pela ditadura da maioria, não pode conviver com a palavra “liberdade”.

E os milhões de mortes?

“Comunismo não é amor. Comunismo é o martelo que usamos para esmagar o inimigo.”- Mao Zedong

Resta então a questão final: e a montanha de cadáveres de que Roger, do Ultraje a Rigor, falou para a senhora?

Ora, já vimos que socialismo MARXISTA é matar populações inteiras, é ter o poder completo sobre as pessoas mesmo que isso mate-as de fome, é criar uma ditadura totalitária de poder e coação sobre corpos e mentes. Mas de onde Roger tirou o dado de que o comunismo matou 80 milhões de pessoas no século XX?

Roger parece estar bastante equivocado. O número é incrivelmente superior. Talvez seja o dobro. Os dados são de ex-comunistas que tentaram ainda salvar sua honra escrevendo O Livro Negro do Comunismo, que na França só obteve como resposta muxoxos ocos como os chavões da sua farândola.

A dificuldade em enumerar as mortes não é de mero “chute”, como afirmou recentemente uma colunista brasileira fofinha e burrinha – é de determinar se as mortes por fatores como fome, guerra, exaustão etc merecem entrar na conta do comunismo, ou só de comunistas individualizados. Pelo que estudamos acima, sim, a culpa é do sistema.

Archie Brown, um dos maiores estudiosos do comunismo, no livro Ascensão e Queda do Comunismo, resenhado por mim conta que antes mesmo de a Segunda Guerra eclodir, mais de 4,5 MILHÕES de soldados russos morreram. A culpa de Stalin era enorme: seu sistema tratava como “traição” qualquer resultado pífio – e assim é o comunismo em todo lugar – e mandou para a cadeia muitos marechais antes da guerra. Na histeria que é a luta por maioria, marechais iam da cadeia para o heroísmo nacional em questão de semanas.

As populações eram usadas para proteger o sistema comunista, e não o contrário. Presos políticos (eles não existiriam se o sistema não fosse comunista, não é?) eram usados para marcharem sobre campos minados, para depois o Exército Vermelho passar. Praticamente sem entrar em confronto com os alemães, 20 milhões de soldados soviéticos morreram na Segunda Guerra de frio (com um sistema que não produzia nem roupas para soldados, que dormiam dentro de animais mortos para se aquecer), fome (faziam uma refeição por dia, contra 5 dos soldados americanos), doenças e afins.

Como não computar na conta do comunismo? Fossem países capitalistas, dificilmente teriam morrido tanto. Mas ainda assim, são lembrados mais como mortos pela guerra do que pelo comunismo.

Qualquer averiguação sempre os joga para o alto. Como é o Memorial das Vítimas do Comunismo, que nem tem uma conta tão pessimista (não conta muitas das que citei), marca 110 milhões de mortos graças ao comunismo. O nazismo matou 6 milhões de judeus, e em tempo de guerra.

Primeira conclusão

“Socialismo, como as antigas ideias de onde ele surge, confundem a distinção entre governo e sociedade. Como resultado, sempre que criticamos uma coisa feita pelo governo, os socialistas concluem que criticamos esta coisa feita em si.”- Frédéric Bastiat

Desta forma, Luciana Genro, parece que quanto mais estudamos o socialismo, mais nojo temos dessa coisa – como não é possível estudar o nazismo e continuar gostando. Parece mesmo que quem defende um ou outro ou é mal caráter, ou está mal informado. Estou apostando na segunda hipótese.

E isso porque não falamos dos argumentos econômicos de Thomas Woods ou Hermann-Hoppe, das análises da esquerda moderna “não-socialista” que põe o mundo nas mãos de um comuno-fascista como Vladimir Putin, das pesquisas históricas envolvendo os arquivos de Moscou, das discussões políticas atuais que envolvem o movimento comunista, de dissidentes e fugitivos (quase todos eles antigos crentes na religião do comunismo!), que vão de Solzhenitsyn e Arthur Koestler a Vladimir Bukovsky…

E nem falamos do mais importante para se entender o pensamento socialista/de esquerda: o incrível Main Currents of Marxism, de Leszek Kołakowski. E os historiadores, de Anne Applebaum a Orlando Figes?

E os argumentos contra Marx, de Böhm-Bawerk (que mostrou que não existe “mais-valia” antes de Marx terminar de escrever O Capital) a Benedetto Croce, mostrando que o “materialismo histórico dialético” é uma mentira?

Assim, espero ter mostrado à senhora que, estudando, as pessoas deixam de ser de esquerda, e não o contrário. Que não somos liberais e/ou conservadores por sermos malvados, e sim por sabermos algo que vocês não sabem.

Talvez percebendo isso, a senhora resolva estudar o que não estudou e daqui a uns anos apareça como uma nova dissidente, como David Horowitz, Thomas Sowell, Eric Voegelin, Andrew Breitbart, Koestler e tantos outros o são. E possa passar a atuar politicamente e quem sabe escrever sobre como estava errada durante todo esse tempo, e que o caminho correto é lutar pela liberdade, e não pelo socialismo, o controle total sobre outras pessoas.

O caminho está aberto para a Luciana Genro direitista 2024, após uma década de estudos. Será muitíssimo bem recebida, cara Luciana Genro.


*FLAVIO MORGENSTERN é Analista político, palestrante e tradutor. Escreve para jornais como Gazeta do Povo, além de sites como Implicante e Instituto Millenium. Em breve lançará seu primeiro livro pela editora Record.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Acidente e descaso no RU3 da UFRGS

Emenda feita com sacola plástica
Na última terça-feira, 02, o Restaurante Universitário do Campus do Vale da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, conhecido como RU3, voltou a figurar nas páginas dos jornais. Um acidente com um caldeirão feriu quatro trabalhadores, que foram socorridos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e encaminhados ao Hospital de Pronto Socorro (HPS). Esta não é a primeira vez que o RU3 vira notícia. Em setembro do ano passado, o restaurante foi interditado pela Coordenadoria Geral de Vigilância em Saúde (CGVS) de Porto Alegre por falta de condições sanitárias adequadas.

Válvulas dos caldeirões com ferrugem
Os Restaurantes Universitários da UFRGS são dirigidos por Cassia Corbo, Diretora da Divisão de Alimentação (DAL) da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PRAE), e têm por finalidade o preparo e distribuição de refeições ao corpo discente, docente e técnico administrativo da Universidade. Em especial, o RU3, onde houve o acidente, está sob a gerência da servidora Noeli Terezinha dos Santos Adamatti. Toda estrutura está subordinada ao Pró-Reitor Ângelo Ronaldo Pereira da Silva.

Tubulações emendadas com fita adesiva
O Restaurante Universitário do Campus do Vale, conforme dados do ano de 2008 divulgados pela PRAE, é o RU mais utilizando pela Comunidade Acadêmica da UFRGS, tendo servido 504.255 refeições naquele ano. Em seguida, vem o RU1 - Centro (431.644 refeições), RU2 - Saúde (249.426 refeições), RU4 - Agronomia (106.318 refeições) e RU5 - ESEF (3.739 refeições). Assim, seu fechamento está causando enorme transtorno para todos os estudantes, sobretudo pelo fato de que as lancherias disponíveis no Campus não possuem estrutura para comportar a demanda e, além disso, cobram preços muito elevados em comparação com aqueles praticados pelo RU, que servia refeições à R$1,30, sendo isentos os estudantes carentes.

Saída de vapor do caldeirão regulada com latinha de milho
O acidente, que ocorreu por volta das 9 horas da manhã da última terça-feira, envolveu um caldeirão utilizado para o cozimento de feijão, que explodiu vitimando quatro funcionários. O sinistro está sendo apurado pelo  Departamento de Segurança no Trabalho e pela Superintendência de Estrutura da UFRGS, que ficaram responsáveis pela elaboração de um laudo indicando as causas da explosão.

Fotos divulgadas na internet após o acidente mostram as precárias condições de higiene e trabalho no Restaurante Universitário do Campus do Vale. Conforme as imagens, diversos equipamentos e canos possuem emendas feitas com fita adesiva e sacolas plásticas amarradas à tubulação para evitar vazamentos de água e gás. Diversas tubulações e conexões estão danificadas e com ferrugem. Ainda, a sujeira produzida pela cozinha é liberada diretamente no chão, por onde escorre através de bueiros.

Sujeira escoa através de bueiro no chão
Em setembro do ano passado, o Restaurante Universitário do Campus do Vale foi interditado pela Coordenadoria Geral de Vigilância em Saúde (CGVS) de Porto Alegre por falta de condições sanitárias adequadas, permanecendo fechado por 12 dias. Entre outros problemas, foi constatado o péssimo estado de conversação em utensílios de cozinha como tábuas de corte, caixas plásticas e panelas. Havia ainda coifas e canos de condução e gás com acúmulo de gordura, fator que propicia a presença de insetos, baratas e ratos. Ainda, a estrutura física da cozinha apresentava problemas como forro aberto, ausência de porta na área de manipulação de alimentos, fossas abertas exalando fortes odores, acúmulo de água no piso em função de vazamentos no encanamento, ausência de barreiras físicas eficientes para impedir a entrada de insetos e encanamento sem conexão com esgoto. Foram observados ainda lixeiras sem pedal e com acionamento manual da tampa, teto sujo, acúmulo de sujeira embaixo das pias e ralos abertos. A câmara fria também estava superlotada de alimentos, aspecto que prejudica a conservação dos produtos, além de não haver produtos como álcool gel, sabão e papel toalha, necessários para a higienização das mãos dos responsáveis pela manipulação dos alimentos.

Pró-Reitor Ângelo, responsável pela manutenção e
conservação dos Restaurantes Universitários
Diante disto tudo, o DCE Livre – Movimento Estudantil Liberdade – entende que os restaurantes universitários prestam serviço de assistência estudantil fundamental para toda a Comunidade Acadêmica e o descaso demonstrado pelo Pró-Reitor de Assuntos Estudantis Ângelo Ronaldo Pereira da Silva com a manutenção das condições de higiene e trabalho no RU3 afronta a própria dignidade do corpo discente da UFRGS.




Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...